Sunday, September 09, 2007

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Engenheiro por formação, não tardou a ser bem sucedido. Com um histórico escolar repugnante, já era indicado pelo reitor aos melhores centros de pesquisa ainda enquanto estagiário em uma repartição pública.
Modelo descoberta num fim de semana na praia - que lhe rendeu o término do namoro - adora gastar seu dinheiro com obras de arte. Estuda a arte e sua rica história. Coleciona desde impressionistas à surrealistas. Sempre que vem ao Brasil visitar a família, não perde a oportunidade de visitar o Largo da Ordem. O engenheiro responsável pela obra de seu museu era um dos melhores do mundo. O preferido de Niemayer. Disse uma vez numa entrevista a uma revista feminina (dotava de uma beleza helênica além de se portar sempre muito elegante) que “com um histórico escolar repugnante, já era indicado pelo reitor aos melhores centros de pesquisa ainda enquanto estagiário em uma repartição pública”.
No vernissage que inaugurou o museu homônimo ao pai da modelo internacional, a anfitriã e o engenheiro foram fotografados juntos várias vezes quando conversavam e trocando muitos toques e risos passadas algumas taças de champanhe. No dia seguinte eram capas de revistas e o principal assunto nos salões de beleza. Nenhum flagrante e muita especulação.
Assim que amanheceu, a assessora de imprensa da modelo ligou para o engenheiro e agendou um almoço numa pousada ao pé do pico Marumbi. Já tinha conversado com a cliente, que aceitou o plano. No horário combinado, os dois helicópteros se revezavam ao pousar. Conversaram por alguns minutos sobre o dia anterior, sobre o projeto e um pouco sobre o futuro. Ela escolhe a entrada. Ele sugere a carne e ambos chegam a um consenso quanto ao vinho. Durante a refeição apenas futilidades sobrevoam a mesa. De um lado ao outro. Futilidades. De dar enjôo até em monge. Terminado o almoço, o metre sugere uma sobremesa divina. Ela engasga e, como se fossem amigos a anos, anuncia que está grávida. Ele, que já se via no altar com a modelo, para de respirar, fecha o semblante e dá mais uma servida colherada na sobremesa. Demora a mastigar. Aproveita para fingir pensar numa pergunta, numa reação, mas no fundo está utilizando de toda a força para enforcar até a morte a modelo. Ela percebe que precisa se explicar e comete o que seria um equívoco: “é sério. Estou grávida! E preciso viajar, em breve.” Ele mantém-se quieto esperando mais explicações. “pode não acreditar, mas fui abduzida. Minha família sempre teve contato com extraterrestres. Por isso sou bonita. Por isso fui descoberta. Por isso o amor pelas artes. As artes são a representação do inconsciente do abduzido. Uma mensagem, uma comunicação extraterrena não com os humanos, mas sobre os humanos entre os visitantes de outros planetas. Cada um usa uma linguagem através de nosso inconsciente.”
- Táh! E para aonde vai? Quando terá de viajar? E o que eu tenho a ver com isso?
- Ainda não sei, mas preciso que tome conta do museu.
- Não posso. Tenho muitos projetos importantes.
- Agora essa é a sua missão. Já tem todo o dinheiro que precisa.
Assim que voltaram aos seus cotidianos, o engenheiro recebe a visita de um alienígena em sua casa. Dizia precisar do engenheiro. A nave tinha problemas e não conseguiam voltar. Omitiu não ser mecânico e barganhou a modelo pelo concerto. Pela contraproposta teria que ir junto. Foi.
A assessora de imprensa foi internada como louca após tentar explicar honestamente o sumiço dos corpos. Passou a pintar e a esculpir sob o efeito dos calmantes. Descobriu seu estilo, ganhou sua fortuna e conquistou sua liberdade.