Thursday, October 11, 2012

Trovas em dó



Antes de o sol nascer já levantava da cama independente da temperatura que fazia lá fora. Tomava seu banho, fervia seu café com leite sem açúcar, chapava seu pão com margarina, escovava os dentes, mais um retoque nos fios de cabelo e pronto! Rumava sentido a estação central, destino da maioria dos trabalhadores daquele inicio de século.
Era meados do ano de 2002 e o fim do mundo ainda era assunto. Mas não se importava com o fim do mundo, com o inferno, com a chuva que caía, com as pessoas que andavam de guarda-chuva sob a mesma marquise. Bateu seu ponto, saiu a campo e comeu sua maçã. A partir daí tudo mudou. Uma guitarra na vitrine lhe despertou algo que nunca havia sentido na vida: a possibilidade do sucesso! Sucesso para si era ter ao redor aqueles que nunca teve. A família havia se separado em virtude da pobreza, dos problemas com as drogas e conflitos pessoais. Os amigos eram as conversas paralelas na fila do transporte, sempre em críticas ao governo. Aquela guitarra lhe projetou nos grandes palcos, o assédio, o reconhecimento e lógico o conforto da riqueza. Era do tipo que não deixava nada para depois e tratou logo de parcelar a passagem para o futuro.
Com muito esforço aprendeu sozinho a dedilhar as primeiras notas e em pouco tempo já batia as primeiras notas. Entrou para a banda da igreja e assim fazia seus primeiros amigos. Aos domingos formou seus primeiros fãs. Os solos já deslizavam como o artista da TV. Certo dia, em uma conversa paralela na fila do transporte sobre o governo e a falta de atenção aos problemas dos pobres, uma moça lhe fitou com os olhos. Inesperadamente seus olhos desviaram como se fugisse da luz do sol. E ela continuava lá, a lhe olhar. Caminhou em sua direção e elogiou seu trabalho na igreja. Neste momento aquela guitarra havia cumprido a sua missão. Começaram a sair e conheceram o amor. As circunstâncias romperam esse laço, mas a guitarra estava lá, em suas mãos, como as rédeas de seu destino.

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