Ontem fui à uma peça. Antes precisei matar uma hora de tempo, pois cheguei uma hora adiantado à bilheteria. Era algo meio Hitleriano que me dizia me dar a certeza de que uma hora antes eu teria o ingresso (que era gratuito) em meu poder. Enfim, por falta de criatividade fui ao bar mais agradável mais próximo, cuja peculiaridade é um banheiro com um mictório invisível. Sim, pois no local do mictório há um aviso: “com defeito”, porém não há mictório algum, a não ser a marca no azulejo que remete à existência outrora de um mictório, além da luz funcionar por meio de um sensor que a acende assim que você adentra ao banheiro. O interessante é que ela sempre apaga enquanto urina. Urinar no escuro é como tocar sem retorno ou assinar sua carteira de motorista. Curiosidades à parte, bebia eu como se esperasse alguém. E ela veio. Em minha direção. E não veio só... trouxe consigo aquela pele morena que me lembra o primeiro chocolate ao leite que como na Páscoa. Um pouco mais clara, talvez pelas constantes neblinas que caracterizam nosso inverno. Trazia também aquele cabelo cacheado, que vindo contra o vento a deixava em câmera lenta. Longas pernas que caminhavam em minha direção a passos de passarela. Disto tudo só sobrou o perfume. Ela passou sem nenhum olhar que cruzasse os meus. E eu continuava a beber como se esperasse alguém. A hora passou e fui à peça que me serviu de uma única coisa: não beba antes das peças. A incontinência urinária que se segue interrompe a atenção e a preocupação de levantar-se e atravessar todo o teatro por entre as pessoas interessadas, ainda no começo da peça, agrava a sensação de ter cometido um grande equívoco.
Saí em direção ao banheiro e pensei: neste exato momento, deixo de acreditar em Deus. A partir deste exato momento passo a conviver com a presença contínua do Diabo, pelo menos em minha consciência. Ora, que sentido faz viver limitando-se contra pecados, quando nos extremos está o âmago do aprendizado. Criei assim uma figura diabólica, a qual me perturba insistentemente, com a qual deixo de lutar e passo somente a obedecer. Luto agora contra o conservadorismo com os qual os pecados nos limitam. Ou melhor, nos impedem de aprender. Dizem que ensinam com os erros dos outros, pois sendo assim farei escola. Vendo cursos. Pois se há prazer em alguma coisa, eu tenho em acertar. Para mim, errar é um processo. Não uma prova para julgamento.
Caminhava com este pensamento e uma rede semântica fulminante, como as que tenho constantemente como espasmos, me iluminou dizendo: leia o livro “o Universo em Desencanto”. Interpretei à minha maneira e hoje faço parte, até então como único membro, do Movimento Anti Horário.
Se quer saber mais sobre o Movimento, antes é necessário que quebre o vazo de porcelana chinesa art-nouveau de sua mãe. A inscrição é um conselho. Assim você passará a ser automaticamente um conselheiro do Movimento.
Verbalize
2 comments:
Quero ser membro do movimento, aonde assino?
Minha mãe não tem nenhum "vazo" de porcelana chinesa art-nouveau, pena, queria tanto participar do movimento... quem sabe numa próxima!
Post a Comment